sexta-feira, 5 de agosto de 2011
Entrevista Exclusiva com Divaldo Pereira Franco
Jornal bimestral da Associação de Divulgadores de Espiritismo de Portugal
Como é o seu dia-a-dia no Brasil?
Divaldo Franco – Quando me encontro na Mansão do Caminho, levanto-me às 7 horas da manhã para o pequeno-almoço, às 8 horas dou início às actividades habituais para atender à nossa comunidade. Mais ou menos às 10 horas, dedico-me à correspondência, tanto por e-mail como convencional. Após o almoço deito-me por aproximadamente 15 minutos, após o que volto ao trabalho, nesse momento com a comunidade. Seis vezes por semana temos reuniões espíritas em nosso Centro: quatro doutrinárias e duas mediúnicas. Quando retorno ao lar, após as reuniões, dedico-me à psicografia, uma média de duas, três horas, até às 3 ou 4 da manhã, a depender do trabalho que está sendo executado pelos Espíritos.
E quando está no estrangeiro, como é esse dia-a-dia?
Divaldo Franco – Obedecendo a uma programação antes estabelecida, evito fazer qualquer tipo de visita, de modo a poder atender os compromissos em clima de alegria e de bem-estar. Não realizo turismo em absoluto, e, terminadas as palestras, mesmo estando em hotel, prossigo no labor psicográfico, de acordo com as directrizes estabelecidas pela benfeitora espiritual Joanna de Ângelis, que sempre convida algum amigo espiritual para escrever.
Olhe, isto é uma pergunta muito primitiva, como é viver sozinho? É uma missão? Foi uma opção?
Divaldo Franco – Naturalmente, à medida que as actividades se multiplicaram, ao largo dos anos, fui sendo absorvido de tal forma que não me dei conta dessas ocorrências, tais como solidão, angústia, ansiedades, faltas ou desconforto... Os fenómenos sociais, as actividades abraçadas foram-me conduzindo de um lugar para o outro e, como tenho muita vida interior, consegui manter o equilíbrio interno, perseverando em paz. Naturalmente, se houvesse encontrado uma esposa companheira teria sido, talvez, mais fácil para a própria tarefa, mas por outro lado, Deus mandou-me tantos corações afectuosos voluntários para acompanhar-me em nossa casa, que passamos a ter uma vida em família, normalmente uma média de 20 pessoas na casa da administração e na comunidade uma média de 400 cooperadores... além dos funcionários remunerados, quase 300.
Os Espíritos atrapalham muito a sua vida? Por exemplo, sei lá, andar por exemplo em casa, nos seus afazeres, aparecerem-lhe assim Espíritos de repente, ou não?
Divaldo Franco – Aparecem-me, sim, os Espíritos, a todo momento. Como sou possuidor de uma espécie de segunda vista, consigo alcançar ocorrências fora do mundo convencional. A princípio assustava-me, porém com o tempo acostumei-me tanto que já não me inquieto. É como alguém que está na rua e retornando ao lar, se é interrogado: «Quem é que você viu na rua hoje? – Ninguém – é a resposta natural». Mas, de facto, a pessoa viu muita gente, somente que não se deteve na observação. Quando se trata, porém, de um Espírito conhecido, quase sempre se estabelece um breve diálogo. Os Espíritos inferiores, às vezes, tentam criar-me problemas no entorno, lançar pessoas desprevenidas contra mim, criar situações embaraçosas que, de alguma forma, eu consigo administrar bem.
O Divaldo vê os Espíritos apenas quando se concentra, quando quer, ou só quando eles lhe aparecem?
Divaldo Franco – É um fenómeno quase normal. É como estarmos vendo aqui na sala cadeiras e móveis, sem que nos chamem a atenção, como resultado do hábito. Da mesma forma adquiri uma espécie de técnica, que seria uma forma de ver sem enxergar, excepto quando há algum interesse de minha parte, ocorrendo uma fixação mais demorada e complexa em relação aos desencarnados que se me apresentam.
O Divaldo também sofre de problemas obsessivos?
Divaldo Franco – Penso que não. No começo da mediunidade convivi com uma Entidade amiga que afirmava odiar-me e buscava perturbar-me, o que se prolongou por um longo período, tornando-se, por fim, com o meu esforço de transformação moral e espiritual para melhor um grande amigo, e hoje praticamente um benfeitor. Está preparando-se para reencarnar. Mas alguns adversários da causa espírita, em decorrência do meu passado, muitas vezes procuram afigir-me, projectando-me pensamentos perturbadores, criando-me situações mais difíceis no relacionamento social, na internet, mas, graças a Deus, não lhes atribuo qualquer importância, compreendendo que isso é natural em relação a todas as pessoas que se dedicam ao bem.
O Divaldo tem consciência se alguma vez foi mistificado, se isso aconteceu?
Divaldo Franco – Logo no começo, a benfeitora Joanna d’Ângelis na área da psicografia, depois de reunir muitas mensagens, sugeriu-me que as destruísse, porque todas eram treinamento e muitas procediam de Entidades de vários níveis evolutivos. Publiquei raríssimas por ela consideradas credoras de divulgação. A partir de 1964, ela selecionou diversas que lhe pareceram próprias e reuniu-as no livro intitulado “Messe de Amor”, iniciando uma fase nova. Algumas Entidades que se faziam passar como letradas, foram discretamente sendo recusadas, embora contribuíssem para o treinamento mediúnico, dando lugar à presença de Espíritos generosos e amigos.
Sob o aspecto doutrinário, é bem provável que haja ocorrido alguma mistificação de que não me dei conta, considerando-se as minhas próprias imperfeições.
Mas isso é propriamente uma mistificação?
Divaldo Franco – Em verdade, não, porque eu podia identificar aqueles que eram levianos através dos fluidos de que se faziam portadores. Mesmo quando escreviam com beleza, faltava-lhes o conteúdo moral e espiritual relevante. Todo médium percebe, através de cuidadosa observação, quando está sendo mistificado, porque os desencarnados podem fingir mas não modificar as qualidades dos fluidos de que são portadores...
Mas no seu dia-a-dia nunca se apercebeu assim de alguma mistificação, ou a sua experiência já lhe permite dar…
Divaldo Franco – Às vezes, os comunicantes dão informações que eu sei que não correspondem à realidade, facultando-me manter muito cuidado quando estou diante de alguém necessitado, que me pede auxílio, de modo a filtrar as mensagens e somente transmitir aquelas que o podem ajudar. Quando as pessoas vêm ter comigo, às vezes estão acompanhadas, e esses Espíritos dão-me notícias que não correspondem à verdade. Como já os conheço, não as transmito. Somente quando se trata de um Espírito confiável, em particular sob a supervisão de Joanna de Ângelis que, normalmente está comigo, dentro do seu esquema de compromissos espirituais, é que me faculto liberar as informações.
O Divaldo é endeusado por muita gente. Como é que lida com isso?
Divaldo Franco – É uma coisa desagradável, porque as pessoas elaboram uma imagem que não corresponde à realidade, e em algumas ocasiões querem obrigar-me a vestir esse uniforme, que aparenta um indivíduo fora da realidade. Felizmente, pela minha forma de ser, eu me posso permitir uma vida autêntica e desmistifico essas imagens irreais, decorrentes da ingenuidade ou da ignorância doutrinária dos menos atentos. Graças a Deus não tenho necessidade de holofotes, sou pessoa simples, jovial e sempre me encontro de bom humor, sem aparências de autoridade ou de alguém irretocável. Sou uma pessoa com problemas, com necessidades evolutivas... Bem sei que as mãos que aplaudem são as mesmas que apedrejam, assim como os lábios que beijam também mordem... Na condição de divulgador do Espiritismo, procuro diminuir-me para que a mensagem se engrandeça...
O Divaldo tem carro, conduz?
Divaldo Franco – Não, não aprendi a conduzir, porque à época da mediunidade muito estuante eu via acidentes, pessoas a atirarem-se à frente do carro em que eu me encontrava, assim como de outros veículos, o que me produzia muita angústia. Então, Nilson que sempre dirigia, nunca me ensinou, e confesso que não me faz falta. (risos).
O Divaldo, bebe vinho? Vinho do Porto, de vez em quando um uísque, ou não?
Divaldo Franco – Não, uísque nunca! E vinho do Porto, sim, especialmente quando venho a Portugal. Uma vez experimentei-o, gostei do seu sabor adocicado, mas por incrível que pareça, ataca-me o fígado. Dá-me indisposição, porque é muito forte, o que eu considero um bom mecanismo de defesa, e mesmo que seja tentado pelo gosto, não vou adiante.
Come carne?
Divaldo Franco – Sim, não preferencialmente.Viajando muito e quase sem cessar, não me posso permitir o luxo de manter determinadas dietas constrangedoras àqueles que me hospedam. Imagine chegar-se a numa residência, e os anfitriões tiveram a gentileza de preparar uma alimentação com base carnívora e dizermos que seguimos outro regime... Além de descortesia é também exibicionismo. Desse modo, não tenho preconceito com nada, sempre aberto à aprendizagem em tudo...
Quem é que lhe compra a sua roupa, o seu calçado?
Divaldo Franco – Sou eu próprio.
Vai às compras, como os outros?
Divaldo Franco – Sim, mas raramente, porque o “Irmão Tempo” de que disponho é muito escasso. Mas há uma coisa curiosa… periodicamente, mesmo sem o desejar ou insinuar, alguns poucos amigos me presenteiam. Tenho procurado manter o pudor de não explorar as pessoas amigas, aproveitando-me da sua amizade. Muitos médiuns dizem que não cobram nada, mas aceitam presentes de alto preço, o que eu denomino como “a indústria dos presentes”. Recebem jóias, roupas de griffe, sapatos de alto luxo, e isto não é compatível com o bom-tom doutrinário. Algumas vezes, quando pessoas estranhas me trazem esses mimos, eu lhes solicito: «Por favor, me desculpe, mas eu não posso receber», e essa atitude causa choques, desagrados... É claro que temos amigos e afectos que nos homenageiam com a sua bondade, o que é diferente. Porém, pessoas sem nenhum vínculo emocional, invariavelmente levam esses descuidados à prática da simonia. Conheço exemplos de alguns confrades que exigem viagens em voos de primeira classe, hospedagem em hotéis 5 estrelas... Confesso que, comigo, isso não ocorre. Deus me permitiu trabalhar trinta e cinco anos, aposentar-me, dispor de salário que não é muito alto, mas é digno, facultando-me manter a existência dentro dos padrões que me caracterizam. Resido na Mansão do Caminho, dou uma quota como contribuição para o bem geral, para não viver da caridade, embora eu me dedique vinte e quatro horas à sua assistência, e ainda disponho de algumas moedas que me permitem auxiliar o meu próximo quando necessário.
Tem momentos de tristeza na sua vida?
Divaldo Franco – Sim, certo dia a benfeitora Joanna de Ângelis me esclareceu: Uma pessoa normal entristece-se vez que outra. A pessoa que não tem a emoção da tristeza, está em trânsito para a esquizofrenia, alienando-se. Tenho, porém, muito cuidado para que a tristeza não se transforme em melancolia, tentando estabelecer morada nos meus sentimentos. Como tenho uma vida mental muito activa, e na Mansão do Caminho é tudo muito variável, quando se me acerca a nuvem da tristeza, do desencanto resultante de alguma decepção, procuro uma outra alternativa para superar e, felizmente, libero-me da situação.
O homem Divaldo tem dúvidas existenciais?
Divaldo Franco – Supreendo-me com as dúvidas que pairam em muitas pessoas e que felizmente não me ocorrem. Como procedo da religião católica, e tive a fé natural, transferi-me para o Espiritismo, que é portador da fé racional com tranquilidade e sem conflitos de qualquer natureza, mantendo segurança doutrinária e certeza, sem a presença de inquietações. Realmente, não tenho dúvidas existenciais.
Existem pessoas que não gostam de ti, obviamente.
Divaldo Franco – Lógico. Confesso que as compreendo...
Como é que se apercebe? Há uma projecção de dardos mentais? Como é que se protege?
Divaldo Franco – Muitas vezes, nas palestras, eu capto as reações de antipatia de uma ou mais pessoas, a vibração negativa, e procuro não as focalizar, evitando perturbar-me, sintonizar com a onda dissonante. No dia-a-dia eu noto as animosidades pela maneira como sou tratado. Às vezes, a pessoa é formal comigo, e nada obstante eu sinto a onda de inimizade, permitindo-me não devolver o sentimento e facultando-me o esforço para demonstrar à pessoa o que sou, não me deixando, porém, impressionar. Lamento a ocorrência, e concluo que a mesma se dá porque não me conhecendo o indivíduo projecta a auto-imagem de que não gosta... Desse modo, não me intranquilizo. Afirma-me a benfeitora espiritual Joanna d’Ângelis, «que ninguém se encontra no mundo sem inimigos, mas que isso não tem importância. O importante, isto sim, é não ser inimigo de ninguém».
Que livro é que anda a ler agora?
Divaldo Franco – No momento eu ando a ler vários livros, porque as pessoas muito gentilmente mos oferecem, alguns deles excelentes, e como o tempo não me permite uma leitura mais tranquila e contínua, estou lendo três, quatro… Estive lendo recentemente um admirável, da Dr.ª Elizabete Lukas. Ela foi discípula de Viktor Frankl, que propôs a Logoterapia, a terapia do sentido existencial. Chama-se “Histórias que Curam”. Ao invés de fazer a terapia convencional, ela conta factos ao paciente e estimula-o a encontrar um sentido para a sua vida...
Como é que se chama essa doutora, Elizabete Lucas? Só pode ser boa pessoa! (risos)
Divaldo Franco – Mas é Lukas com “K”!... (risos)
Qual é o seu programa de televisão favorito? Se é que tem um.
Divaldo Franco – Não, não tenho nenhum. Normalmente, quando eu estou muito cansado assisto ao Discovery, mas é pela madrugada, ou às vezes Animal Planet porque eu gosto muito de ver os nossos irmãos... A alma se enriquece de sabedoria, acompanhando-lhes a trajectória e as sábias disposições da Vida que os mantém, os seus fenómenos sociológicos, a cadeia alimentar, etc.
O Divaldo psicografa quando os Espíritos lhe aparecem e dizem: «Olha, Divaldo, agora vamos escrever», ou têm um horário próprio e eles depois esperam?
Divaldo Franco – Em face das viagens, a mentora Joanna de Ângelis informa-me que irá convidar algum amigo espiritual da cidade ou da sua equipa com o objectivo de escrever algo sobre o tema que foi abordado na conferência, ou algo especial... Quando, porém, se trata de romances de Victor Hugo, Manoel Philomeno de Miranda e outros, eles propõem-me, com muita antecedência, que não assuma compromissos fora de Salvador, e então escrevem por 14 a 16 horas, num período de 18 a 25 dias, com os intervalos necessários, a obra que desejam divulgar.
E aguenta?
Divaldo Franco – Aguento, sim. É muito interessante, Lucas, porque eu fico dentro da esfera psíquica do comunicante, tendo a mente enriquecida pelas imagens que eles me projectam, como se eu fosse ao teatro ou ao cinema e descortinasse paisagens desconhecidas, informações felicitadoras. Esse fenómeno é fascinante porque me envolve, mantendo-me numa psicosfera muito especial.
E então não fica desgastado?
Divaldo Franco – Não, porque, em razão de entrar em transe profundo, quando desperto, apesar de algum cansaço físico, pouco tempo de sono fisiológico me faz recuperar o bem-estar. Normalmente durmo pouco, e algum tempo é-me suficiente para a recuperação.
Usa celular?
Divaldo Franco – Não. Quando estou em viagem, utilizo um aparelho que me foi oferecido por um amigo português, somente para comunicar-me com a Mansão do Caminho ou para alguma outra urgência, e o faço apenas nos momentos de necessidade. Por incrível que pareça, ainda não memorizei o número do celular. (risos)
Vou-lhe fazer uma pergunta, que se calhar é despropositada. Qual é o seu pior vício como ser humano, se é que tem algum?
Divaldo Franco – Ah, acho que é comer. Eu adoro comer (risos). Como durmo pouco, raramente passeio, ou faço exercício físico, a alimentação muito me atrai, mas sou comedido e supero a tentação de comer um pouco mais, especialmente durante as viagens, pois receio qualquer problema digestivo. Desse modo, cuido de dar-me atenção.
E a sua maior virtude?
Divaldo Franco – A maior virtude… se assim a posso chamar é o prazer de servir, de ser útil, porque aprendi com a benfeitora Joanna que me informou oportunamente: «Aquele que não aprendeu a servir ainda não aprendeu a viver» e noutra oportunidade, há muitos anos, ensinou-me: «Nunca deixes ninguém afastar-se de ti sem que leve qualquer coisa boa que tenhas, e, quando não tenhas nada para oferecer-lhe emite uma onda mental generosa, um sorriso, um bom pensamento. Oferta algo de ti mesmo, não deixando que ninguém se afaste de ti sem que leve uma contribuição feliz, por menor que seja...». Porque as pessoas vêm ter comigo, e saem magoadas quando querem uma resposta que não é compatível com a verdade, em relação aos seus problemas, e nem sempre me é lícito concordar com tudo, porque seria falta de coerência doutrinária. Assim sendo, procuro dar respostas suaves mas verdadeiras, e por fim sorrio, peço desculpas, seguindo adiante.
Quem é que foi o Divaldo Franco numa vida anterior?
Divaldo Franco – Tenho alguns flashes, algumas lembranças, de existências passadas. Quando fui a Paris pela primeira vez, em 1967, tive uma (re)vivência muito característica, identificando-me com determinado sacerdote católico que criou uma ordem religiosa por volta de 1625, durante o período do cardeal Richelieu... Eu estive no monastério naquela ocasião, mantive contacto com a abadessa, que foi muito simpática e estabelecemos um contacto epistolar até à sua desencarnação em Bruxelas, alguns anos depois. Dessa existência tenho lembranças muito claras, assim como de outra existência na qual exerci a mediunidade.
Por José Lucas, em 5 de Outubro de 2009, no VII Congresso Nacional de Espiritismo, em Viseu, Portugal.
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